Perturbador, filme norueguês recria massacre em acampamento juvenil

GUILHERME GENESTRETI

Já tem dono o título de filme mais brutal da atual edição do Festival de Berlim –e provavelmente de todo o calendário. É o norueguês “Utøya 22.Juli”, que, a partir de uma montagem sem cortes, recria os 72 minutos em que estudantes do país estiveram encurralados, na mira do atirador de extrema-direita Anders Behring Breivik, em 2011.

O diretor Erik Poppe não mostra o atirador. Prefere acompanhar, com uma câmera na mão, o desespero e a matança dos jovens acampados na ilha de Utøya.

Os onipresentes sons de disparo e a correria das vítimas ao redor incrementam o terror psicológico num intento que é muito claro: fazer o espectador se sentir dentro do cenário da matança. O resultado é perturbador.

“Na Europa de hoje, com o neofascismo crescendo, eu tinha que lembrar as pessoas do que aconteceu naquele lugar”, disse Poppe em conversa com a imprensa após a sessão. “E queria mostrar que por 72 minutos aqueles jovens estiveram sozinhos.”

É nesse cenário que encontramos Kaja (Andrea Berntzen), garota de 18 anos inspirada, como os demais personagens, nas vítimas reais do atentado. Os 12 minutos iniciais da obra desenvolvem um pouco sua relação com a irmã e com os demais amigos acampados na ilha.

Depois, irrompe o pandemônio. Um grupo surge correndo, fugindo dos tiros. Sem entender ainda o que houve, a garota se refugia. Depois foge, sai correndo, se esconde entre feridos, topa com cadáveres, encontra outros que, como ela, não sabem por que estão sendo massacrados… Numa das cenas, uma garota que acabou de morrer revele a ligação da mãe no celular; noutra, um menino em pânico não consegue se mexer para fugir.

Na sessão para jornalistas, era incessante o barulho de pessoas se movimentando nas poltronas, desconfortáveis com o retrato.

“A ideia era representar aquilo muito próximo do que ocorreu. Mas os personagens são fictícios por questões éticas, para que os parentes não tivessem que reviver o que ocorreu a seus filhos”, disse o diretor, que contou com sobreviventes no set para ajudá-lo a recriar o ataque.

Três desses sobreviventes viajaram a Berlim para a estreia do filme e foram aplaudidos. “É impossível contar o que houve”, disse uma das jovens. “Só consigo descrever aquilo com alguma distância. Acho que o filme mostra o que pode levar o extremismo da direita.”

Foram meses de preparação, segundo Poppe, para coreografar exatamente a movimentação dos personagens durante o atentado. E apenas um “take” foi feito por dia, “porque a exaustão emocional era enorme depois”, disse o diretor.

No páreo pelo Urso de Ouro, o longa tem a seu favor o fuzuê gerado numa competição que não prima exatamente por ser memorável, como a desta edição do festival. Também conta a seu favor o fato de ser um “statement” contra a ascensão da extrema-direita, assunto quente na Europa e que ganha ouvidos numa mostra tão politizada como a Berlinale.

Mas a obra também impressiona os mais sensíveis. E não se sabe como o júri capitaneado pelo diretor alemão Tom Tykwer vai encarar um filme tão motivado a provocar choque.

“Utøya 22.Juli” já tem distribuição garantida no Brasil , mas a data de estreia no país ainda não foi definida.

(Na foto acima, a atriz Andrea Berntzen em cena do filme “Utøya 22.Juli”. Créditos: Divulgação)

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O jornalista GUILHERME GENESTRETI se hospeda a convite do festival