Contra exigências da Disney, cinemas brasileiros ameaçam boicotar filme ‘Viva’

Cena de ‘Viva’
GUILHERME GENESTRETI

Para lançar a sua mais nova animação, “Viva: A Vida É Uma Festa”, a Disney está exigindo que as salas de cinema do Brasil repassem a ela 52% do faturamento do filme, em vez dos tradicionais 50%.

As salas brasileiras não concordam com esse aumento do repasse e cogitam não exibir o filme, que ficaria restrito às cadeias multinacionais: Cinemark e Cinépolis.

“Viva”, feito pela Pixar (pertence à Disney), vai estrear no Brasil em 4 de janeiro.

“Faz mais ou menos duas décadas que esse percentual é de 50%. O mercado foi pego de surpresa com esse aumento”, afirma Paulo Lui, que preside o Sindicato das Empresas Exibidoras Cinematográficas do Estado de São Paulo.

Para se ter uma ideia do que representaria esse aumento: a animação “Moana” faturou R$ 71,5 milhões no Brasil neste ano. Se para o filme já estivessem valendo as exigências, as salas de cinema teriam que ter repassado à Disney R$ 1,4 milhão a mais do que de fato repassaram.

Nesse mercado, essa cifra é “dinheiro à beça”, diz Lui. Ele enumera alguns dos custos das salas de cinema, como aluguel do espaço nos shoppings e manutenção de equipamentos de som e projeção. Só a lâmpada, que precisa ser trocada a cada 500 horas de uso, custa R$ 6.000.

E os custos são fixos: não importa se a projeção é feita para dez ou cem espectadores.

Caso apenas as redes Cinemark e a Cinépolis aceitem exibir “Viva”, o filme ficaria de fora de cerca de 67% do circuito brasileiro (ou 2.100 salas de um total de 3.100).

“Esse aumento é temerário”, diz Márcio Eli de Lima, da rede Centerplex de cinemas, presente em 21 pontos do Brasil, 20 em shopping centers. “O percentual de 50% era histórico. Dois pontos percentuais causarão desequilíbrio na negociação com os shoppings, por exemplo.”

“Aqui no Brasil somos mais frágeis nas negociações”, diz Lui. “Para um exibidor menor isso pode representar a sua sobrevivência.”

Presidente da associação que reúne os pequenos e médios exibidores, Marco Alexandre diz que a Ancine (Agência Nacional do Cinema) “deveria tomar providências”. “Não é justo. Se a Disney cobrar 52%, as outras distribuidoras também vão querer cobrar o mesmo valor.”

Procurada na tarde desta quinta (28), a Ancine não respondeu à Folha se adotará alguma medida até o encerramento desta edição. A Disney informou à reportagem, por meio da assessoria de imprensa, que não tem “comentários sobre o assunto no momento”.

As novas exigências da Disney não são exclusivas para o Brasil. Nos Estados Unidos, os estúdios também entraram em guerra com as cadeias de exibição no lançamento do último capítulo de “Star Wars”.

Ali, exigiram um repasse de 65% (dez pontos percentuais a mais do que o usual no mercado e um a mais do que a Disney costuma exigir).

Também impôs que o filme teria de ser exibido nas salas maiores de cada complexo cinematográfico, e por quatro semanas consecutivas. No Brasil, dadas as diferentes configurações das salas, essa exigência não foi feita.

Os exibidores nacionais se dizem ainda mais preocupados depois que a Disney comprou, por US$ 52,4 bilhões, parte dos ativos da Fox, outro grande empresa do setor.

“Viva”, o filme que causou a celeuma, é uma produção da Pixar, que um dia já foi um estúdio independente, mas foi arrematado pelo estúdio do Mickey em 2006. Hoje, o conglomerado conta ainda com a Marvel, e seu vasto catálogo de super-heróis, e a Lucasfilm, de “Star Wars” e “Indiana Jones”.

Ambientado no México, “Viva” conta a história de Miguel, um aspirante a músico que esconde sua paixão da família e faz uma viagem ao mundo dos mortos. Já arrecadou US$ 500 milhões em bilheteria pelo mundo.