Falta prática aos animadores brasileiros, diz diretor de ‘Rio’

GUILHERME GENESTRETI

Afirmar que o Brasil vive sua melhor fase na animação virou uma espécie de fórmula —por trás das bem sucedidas franquias “A Era do Gelo” (2002-2009) e “Rio” (2011-2014) há o diretor brasileiro Carlos Saldanha; o país ganhou, por dois anos consecutivos, o maior prêmio do Festival de Annecy, na França, o mais importante do gênero; e a TV Paga tem dado fôlego aos estúdios ao exigir cota de produção nacional no horário nobre dos canais.

Na última sexta (17), começou em São Paulo a 23ª edição do Anima Mundi, maior mostra do gênero na América Latina, que traz em sua programação 450 produções –quase um quarto delas nacionais.

Mas nem tudo são flores coloridas nos desenhos dos animadores nacionais. A falta de cursos superiores de qualidade em animação é o maior gargalo, na opinião de Cesar Coelho, um dos criadores do Anima Mundi. À frente do festival há 22 anos, ele testemunhou toda a evolução da animação no país.

Outra questão: mais do que um exportador de animações, o país é um exportador de animadores.

Não por acaso, o nome brasileiro mais conhecido da animação é o de Carlos Saldanha, carioca que firmou sua carreira lá fora: “A Era do Gelo” e “Rio” foram produzidas pela Fox, nos EUA.

O diretor brasileiro Carlos Saldanha na pré-estreia de "Rio", em Los Angeles, em 2011. Créditos: AFP
O diretor brasileiro Carlos Saldanha na pré-estreia de “Rio”, em Los Angeles, em 2011. Créditos: AFP

“O Brasil precisa de mais oportunidades para os animadores”, afirma. “Mais prática e menos teoria.”

Pouco antes de “O Menino e o Mundo” ganhar o prêmio de melhor filme em Annecy, no ano passado, conversei com Saldanha sobre o atual estágio da animação brasileira, em uma entrevista nunca publicada:

Sem Legenda – Como você encara o atual estágio da produção brasileira na animação?

Nos últimos 20 anos a animação no Brasil deu um salto de qualidade e quantidade muito grande. Com a tecnologia mais acessível e o interesse do mercado pela animação, surgiu uma nova e talentosa geração de animadores no Brasil. O Festival de animação Anima Mundi reflete bem este crescimento através da quantidade de trabalhos de animação, feito por brasileiros, que são enviados para o festival. Eles ate criaram uma categoria específica para os animadores brasileiros. Ha alguns anos atrás isto não acontecia. O momento agora e de conseguir projetos maiores e mais investimento para que esta turma criativa não perca a motivação e o interesse pela animação. Ela pode ser um trabalho extremamente lucrativo, mas a qualidade vem através da prática e experiência. Tenho verificado um grande interesse no desenvolvimento deste mercado, mas os resultados ainda são pequenos.

Acredita que sua carreira hoje teria sido diferente se houvesse ficado no Brasil?

Não penso muito nisso. O rumo da minha carreira veio através da minha curiosidade e vontade de correr atrás de um sonho de poder trabalhar com o que eu realmente gostava de fazer: arte e computação. Acabei nos EUA em busca deste sonho e consegui realizá-lo, mas continuo sonhando e olhando para frente. Estou sempre ligado e atento a novas ideias e oportunidades. Cada pessoa tem que tentar definir seu próprio caminho e correr atrás do que realmente a faz realizada e feliz, seja no Brasil ou fora.

Em sua opinião, o que falta às animações brasileiras?

Acredito que talvez o mercado de animação do Brasil precise de mais oportunidades para que os animadores possam pôr em prática seus talentos. Projetos maiores, como filmes de animação, seriam muito importantes para oxigenar esta geração talentosa de animadores, mas para isso não basta apenas boas ideias e vontade de fazer, mas sim investimento. Um animador, como qualquer outro profissional, melhora através da experiência. Mais prática e menos teoria.